terça-feira, 9 de outubro de 2018

Escolhendo entre as piores opções, que nós mesmos escolhemos



E começo a semana desanimado.
Não só pelo resultado das urnas. Sim, por isso também.
Triste porque essas eleições trouxeram à tona o perfil do brasileiro, não só em geral, mas daqueles que estão próximos a nós. E ele é mais feio do que a gente imaginava.
Opiniões políticas divergentes são normais e necessárias. Mas faltou, eu muitos, respeito. Empatia, entender porque o outro pensa daquela forma e faz aquelas escolhas.
Isso não é de agora, vem de muito antes, quando usaram nossa revolta contra a corrupção e transformaram em ódio contra o PT. Sim, por mais que se fale que trata todos os políticos corruptos iguais, é a notícia do PT que você compartilha, é a piada com a Dilma que vai pra frente, é o meme com o Lula que ganha destaque. Não estou defendo o PT ou qualquer integrante do partido. PT foi a minha maior decepção política, pois eu acreditava que era um partido diferente, quando se mostrou ser apenas mais um. Quero que todos os culpados das acusações sejam presos. Entretanto, não sou inocente a ponto de não perceber que isso foi, estrategicamente, usado pela oposição para tirá-los do poder. Sim, nos usaram. Eu e você.
Naquela época já começou a falta de respeito a quem pensava diferente, a divisão em dois lados, preto e branco, bem ou mau, verde-amarelo e vermelho, como se fosse tão simples assim.
E nasceu a ideia que se consolidou. Qualquer coisas é melhor que o PT. QUALQUER COISA.
Foi assim que Bolsonaro cresceu. Primeiro como algo diferente, engraçado, com suas tiradas lacradoras, trazendo respostas rápidas e simples, que todo mundo já ouviu ou falou dentro de suas casas, ou seja "mitando", como dizem. Matar a bandidagem, trazer de volta os "valores morais", defender o "cidadã de bem", "direitos humanos para humanos direitos", definições bem questionáveis mas, acima de tudo, livrar o país do PT. E aí, vale QUALQUER COISA.
Claro, havia um terreno fértil para seu crescimento: a internet.
Ah, internet. Diziam que ela viria para aproximar as pessoas. Que estaríamos entrando na era da informação. Eu, acreditava que a humanidade evoluiria mais rápido com a chegada da tecnologia, da globalização. Porém, o que se vê muito é as pessoas cada vez mais nos seus mundinhos, consumindo cada vez mais informação fast (trash) food e regurgitando como se fossem detentores de toda o conhecimento do mundo.
Se antes as pessoas liam pouco, agora, que têm conteúdo (a maioria, ruim ou inútil) em seus bolsos, a um clique, a tendência é ler menos, conversar menos, olhar menos para o mundo e mais para seu umbigo. E quando se faz isso, você fecha sua mente, fecha seus ouvidos e para de exercitar o raciocínio. Aí as teorias da conspiração ganham força. Porque não se tem mais tempo e nem vontade de se conferir se tal notícia é real ou ao menos tem lógica. "Vamos repassar, vai que...". Ainda mais se falar algo que reforça uma ideia que já acredita. Você passa a desconfiar da mídia tradicional, pois agora a "verdade" está chegando por grupos de whatsapp e pelo Facebook.
 Do "curtir essa foto pro Face pagar U$0,01 pra criança doente", até "a Terra é plana e esconderam isso da gente", é só uma questão de tempo.  Não se acredita mais nos livros de física e geografia, não se acredita mais nos livros de biologia (aumenta cada vez mais o medo de vacina, por exemplo) e não se acredita mais nos livros de história. Ah, aqueles professores de história, todos esquerdalhas!
A Era da Informação pode levar à Era da Ignorância se as pessoas não acordarem.
Vi notícia verdadeira ser chamada de fakenews. Vi uma enxurrada da fakenews. Vi fakenews de correção de fakenews. Vi fakenews tão rudimentar que estava na cara que foi feita pelo próprio grupo ofendido de modo a desmoralizar o outro. Ou se achava que tudo aquilo era verdade, ou, o mais importante era vencer a batalha nas redes sociais. De qualquer modo, todo mundo perdeu.
Aliás, os marketeiros políticos souberam muito bem como utilizar a internet, com notícias verdadeiras e falsas, para angariar votos para os seus clientes. Até os memes engraçados que você compartilha saem, em sua maioria, desses caras. Fomos usados, novamente.  
Decepcionado também fiquei, como católico, com muitos católicos e evangélicos. Estranhei suas escolhas, mas me decepcionei mesmo por muitos usarem a Bíblia, o nome de Deus a religião para ofender e atacar seus irmãos por pensarem diferente ou para defender seus candidatos. De boas, o candidato que mais clama pela preservação da "moral, dos valores cristãos da família", dá vários exemplos não cristãos, então não use isso como argumento. Até porque já vimos muita coisa ruim acontecer em nome de Deus e dos valores morais de uma determinada religião. Ah, idolatria também é pecado, não é, amigos?
O que faltou foi discussão de ideias, de projetos, principalmente sobre os candidatos que polarizaram as pesquisas. Mais importante era derrotar o PT. Mais importante era derrotar o Bolsonaro.
Enfim, estamos numa sinuca de bico, numa saia justa, num "impossible sitution", como diria Jack Bauer.
Dificilmente Haddad vai virar o jogo, porque é muito, muito difícil fazer quem não votou no Bolsonaro votar no PT, em quantidade suficiente.
A ideia de QUALQUER COISA é melhor que o PT é muito forte. E, convenhamos, nunca "escolher o menos pior" foi tão difícil.
E, mesmo se isso acontecer, é capaz de dizerem que eleição foi uma fraude (como já insinuaram) e pedirem intervenção militar (como já insinuaram), e a população entrar na onda, afinal QUALQUER COISA é melhor que o PT. 
Já quanto ao plano de governo do Bolsonaro, nada do que eu vi parece sólido e conciso, ou que trará um bem verdadeiro ao país, em vários aspectos. No mínimo, não vi nenhuma competência. Pelo contrário, o que estou vendo tem me deixado preocupado.  E ele atrai gente de má índole, isso é inegável. Não que todos que votam nele o sejam, mas o discurso dele atrai esse tipo de gente e ele não faz nada para mudar isso. Com sua vitória, e muitos do partido dele, que são até piores, esse tipo de pessoa vai achar que tem liberdade pra fazer o que quiser. Se ele tivesse um pouco de bom senso, enfatizaria em seu discurso a importância do respeito às instituições, ao próximo, aos adversários. Mas ele não o faz, não com a ênfase necessária. Prefere estacar, em sua "live" pós primeiro turno, que vai acabar com a "farra das multas do Ibama" e acabar com os "ativistas". Ou seja, dane-se a ecologia e o meio ambiente.
Enfim, quando o seu governo começar a fazer mer..., e vai fazer, a mídia vai noticiar, mas não vão dar crédito, pois, afinal, a mídia e comprada. E se vierem com projetos que tirem direitos, em prol de deter a "esquerdalha", vão aplaudir, pois é tudo para proteger o Brasil do comunismo.
Porque muitos dos eleitores e políticos do Bolsonaro se tornaram iguais a mutos eleitores e políticos do PT: não enxergam os erros do seu lado e não admitem estarem errados. Sem isso, fica difícil melhorar.
E não dá nem pra pensar em impeachment, pois o vice é pior que ele.
Enfim, espero que o Brasil aguente por quatro anos, sem muitos retrocessos e que possamos realmente aprender algo de útil com tudo isso. Quem me conhece, sabe que sou uma pessoa otimista, mas tem sido difícil esses tempos, meu amigo, tem sido difícil.


2 comentários:

Sony Santos disse...

Parte 1

Olá, amigo!

Venho bem atrasado com esta resposta, tanto que já veio o 2º turno e algumas coisas mudaram; outras não. Tive de adaptar o rascunho original.

Concordo com a maior parte do que você escreveu e, muito respeitosamente, discordo de uma coisa ou outra.

"Triste porque essas eleições trouxeram à tona o perfil do brasileiro, não só em geral, mas daqueles que estão próximos a nós. E ele é mais feio do que a gente imaginava".

Esse perfil repulsivo não é do brasileiro; é do ser humano. Já disse Bertrand Russel no livro Ensaios Céticos: as pessoas tendem a defender suas crenças com paixão, e não com a razão. Acontece em vários contextos, notadamente em política, religião e, no Brasil, futebol. É meio que instintivo e talvez tenha origem evolucionária.

Eu penso que, se duas pessoas pensam diferente sobre algo que não se pode provar, então cada um deveria ficar na sua, pois não há como "converter" o outro.

Exemplos de coisas que não se podem provar:
- a existência de Deus;
- a reencarnação;
- se Jesus é o Messias;
- como vai ser o mandato do candidato X ou Y; etc.
(Qualquer coisa relacionada a futebol é tão absurdo que não tem como colocar nesta lista.)

O que se pode fazer é argumentar, desde que o outro esteja disposto a ouvir; então, primeiro, se deve pedir licença. Uma reunião consentida para discussão pacífica de um assunto polêmico pode ser construtiva, e eventualmente levar a um consenso.

O que passa disso é invasão. Ninguém gosta de ser invadido por ideias contrárias ou ofensivas sem consentimento; é como receber SPAM. Mas na mídia social ninguém está nem aí para "pedir licença". É muito fácil repassar postagens que defendem seu ponto de vista ou ofendem o adversário - já que converter está fora de questão. E em algumas mídias não temos como escolher "não ver". Lixo se mistura com não-lixo nos grupos de whatsapp.

Se não se pode provar, as pessoas devem primeiramente ter ciência disso e ter a humildade de admitir que, desde que não se pode provar, ela mesma pode estar errada, apesar das evidências que acredita ter. Mas, justamente por não se poder provar, a necessidade psicológica de autoafirmação fala mais alto; então as pessoas tentam convencer as outras de que estão certas - ou de que as outras estão erradas. Quando alguém apresenta um argumento a favor de um candidato, mesmo não tendo sido solicitado, está tentando disseminar uma ideia que acha construtiva, um ponto positivo do candidato. Mas quando alguém divulga um ponto negativo do candidato adversário, seus partidários o recebem como ofensa, pois, indiretamente, está atingindo seu ego, sua decisão de escolha, sua inteligência e seu caráter. É chamar o outro de burro e bandido por ter escolhido o outro candidato. Isso inflama os egos e segue a disparada das respostas em tom igual ou pior. Isso é natural da psicologia do ser humano. Acontece com todos, até com os mais civilizados, até com os mais religiosos, até com as pessoas próximas, e até conosco mesmo, quando falhamos em nos policiar. Muito pouca gente consegue ser civilizada e autocontida o suficiente para escapar dessa barbárie. O "Livro de Enigmas de Spock" que você me deu (a propósito, obrigado; estou gostando bastante), por sinal, tem como um dos objetivos estimular as pessoas a tomarem decisões mais racionais e menos emocionais para evitar esse tipo de briga inútil.

Continua na parte 2.

Sony Santos disse...

Parte 2

E é por essa necessidade humana de autoafirmação que as pessoas querem ser reconhecidas por estarem certas e que as outras admitam estarem erradas, mas não entendem que todos pensam assim, de modo que isso nunca acontecerá, mas continuam insistindo na vã tentativa de provar que estão certas e os outros errados. Repassam apenas o que é melhor para o seu lado. "A Era da Informação pode levar à Era da Ignorância se as pessoas não acordarem" - na verdade, elas não querem acordar. Ainda que informação útil e esclarecedora fosse escancarada por alguns seres mais iluminados, "isso não é o que me interessa". A vergonha dói, e as pessoas não querem admitir estarem erradas. Preferem converter os outros pela força. A informação está ao alcance, mas a desinformação flui melhor, automaticamente. Cada um de nós age como um neurônio desregulado, espalhando lixo para outros neurônios, no cérebro de uma humanidade demente. Não é "humano" repassar a verdade, e os marketeiros souberam usar isso.

Naturalmente, quem é a favor de um é contra todos os outros, de forma que há muito mais gente contra um candidato do que a favor. Há muito mais anticorinthianos do que pró-flamenguistas. O resultado da briga Anti-PT x Anti-Bolsonaro foi que os mais rejeitados acabaram indo para o 2º turno! Desde muitas eleições atrás penso que o resultado seria melhor se a gente também pudesse votar contra quem a gente não quer que entre. Tiririca nunca teria sido eleito.

Infelizmente, ainda depois do 2º turno, o problema continua. Ainda vejo fake news e difamações inúteis. Hoje mesmo (28/11/2018) eu recebi um texto dizendo que o Exército já está fazendo o povo nordestino chorar, acompanhado por uma reportagem em vídeo mostrando o Exército inaugurando poços artesianos movidos a energia solar no Rio Grande do Norte, fazendo-os chorar de alegria. Bonito, mas a notícia é de 2013, governo Dilma. Numa missa um padre falou que certo partido não conseguiu pagar as contas de campanha, porque pretendia pagar com dinheiro público se fosse eleito. Outro dia vi um tweet dizendo que o presidente eleito era muito imaturo há um ano atrás. Até quando vamos ver essas coisas? Se já não tem como mudar o resultado da eleição, é inútil continuarem falando mal do candidato X ou Y ou de suas ações, presentes ou passadas. Não vejo outro objetivo senão a autojustificativa ("eu estava certo e você errado"); inútil, como já disse; desnecessário e deselegante. Ninguém vai se arrepender de seu voto. O arrependimento (de cada lado) virá ou não ao longo de um mandato que nem começou. Ainda tem muita gente se preocupando com problemas que não existem. Tais publicações são destrutivas e desgastantes; servem apenas para continuar alimentando as desavenças entre os que são a favor e os que são contra; e não há qualquer perspectiva de algo positivo que se possa fazer com essas postagens.